terça-feira, 7 de setembro de 2010

O marginal

Um sujo na praça me parou pedindo dinheiro. Um cão se coçava e mordia o corpo em busca de pulgas. Mexi nos bolsos e não encontrei nenhuma moeda. Não ia abrir minha carteira ali naquela praça. Nem morto. Balancei a cabeça de forma negativa. O sujo insistiu. Eu vasculhei os bolsos de trás e nada. Balancei novamente a cabeça de forma negativa. Ele insistiu novamente. Olhou para minha carteira, a qual manuseei à sua frente enquanto vasculhava os bolsos traseiros de minha calça. Eu balancei a cabeça e ele não gostou daquela última balançada. De repente, senti um bafo quente no pescoço e quando me virei vi outro sujo atrás de mim. No giro que eu dei, o primeiro pegou minha carteira e a abriu rapidamente. Não havia dinheiro, para o seu descontentamento. Não sei se era por causa da cachaça, ou por causa do zero à esquerda que me mostrei por não apresentar nem uma nota de dois, mas comecei a pensar em fugir dali. Não costumo fazer isso. Mas, num ambiente como aquele, não é bom arriscar nossa honra. O sujo do bafo quente sacou uma faca de descascar laranjas. Como não vi nenhuma por ali, comecei a me preocupar. O primeiro sujo jogou minha carteira no chão e voaram vários papéis na calçada. Um deles se destacou. Era um cartão branco com letras vermelhas. Um às de copas ornava o canto superior esquerdo do cartão. Pelo visto, aquele sujo não era analfabeto, pois além do símbolo do carteado, ele reconheceu o que estava escrito. Vi o suor surgir em sua face. Os olhos dele começaram a pulsar e ficaram vermelhos. Logo, logo, um grito sairia de sua garganta. Antes que pronunciasse aquelas palavras, eu avancei em sua direção, saltando o meu braço direito em seu pescoço. "João Carlos, matador." O outro sujo tentou correr, mas o giro de perna que eu dei foi o suficiente para impedir o seu progresso em direção à rua. No meio da praça eu terminei o meu serviço. Não queria mais fazer aquilo, mas fui impelido a matá-los. Trabalho gratuito. Enquanto eu arrumava os papeis em minha carteira, o cão ainda se coçava e mordia o próprio couro em busca de pulgas.

2 comentários:

  1. Prefiro o marginal com mais coração. Aquele que como um déspota esclarecido mata, após uma efêmera linha de benevolência que lhe solavaca.

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  2. Eu também prefiro o matador com mais coração, Carlos. Ele se coloca no lugar do outro por alguns segundos e tal. Mas se ele fizer isso sempre do outro lado da faca pode estar ele, com alguns mililitros de sangue a menos, longe de um hospital, morto na sarjeta.

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