sábado, 7 de agosto de 2010

Motivos para Matar

Ele saiu à rua com vários motivos para matar. O patrão o despediu, a mulher o traiu, o irmão o roubou, o senhorio o despejou. Como toda pessoa sem experiência no assunto, utilizou alguns produtos disponíveis no mercado para "criar coragem", alguns legais e outros ilegais: bebidas e drogas. O resultado seria o mesmo, não importava a origem da coragem. O patrão seria o último, pois já era domingo e não sabia onde o encontrá-lo nos dias de folga. A mulher foi a primeira. Foi à casa do amante, que, por coincidência, era o irmão. Resolveria dois problemas de uma vez. Bateu na porta e tapou o olho mágico. A última ação era desnecessária, pois seu irmão não costumava olhar antes para saber quem estava à porta. Já o avisara sobre esse deslize. "Qualquer dia um marginal entra na sua casa." Pelo ruído da chave, duas voltas dadas, notou que poderia se antecipar a qualquer movimento do irmão. Deu um tranco na porta e jogou-o longe. Já foi logo sacando uma pistola e dando uma passagem só de ida ao irmão. Olhou para os demais compartimentos da casa, à procura da esposa. Ouviu barulhos no quarto. "Aquela maldita! Transando durante o dia! Sempre regulou os horários comigo e estava transando durante o dia com o meu irmão!" Quando entrou no quarto viu a mulher tentando pular a janela. Disparou na perna direita da mulher. O tiro fez com que ela caísse para trás. Quando ela voltou a cabeça em sua direção, recebeu o tiro definitivo. Precisava encontrar agora o senhorio. "O puto deve estar naquela pocilga, cobrando o aluguel de mulheres solteiras." Chegou ao prédio e caminhou pelo corredor central do primeiro piso. Morara no último piso. Ali no primeiro era onde as mulheres solteiras costumavam morar. Ele fazia a ronda duas vezes por mês, pois cobrava aluguéis semanais das moças. Antes de chegar ao final do corredor viu uma porta se abrir e o senhorio saíndo com uma mão segurando a calça e a outra mão segurando o dinheiro. O olhar de surpresa do senhorio ao levantar a cabeça em direção à entrada do prédio foi o sinal de largada. "O que você está fazendo aqui? Já não o mandei embora do meu prédio, seu vagabundo?" Antes que essa última palavra fosse pronunciada, a garganta do senhorio se preencheu de sangue. Uma bala penetrou o meio de seu peito. O líquido começou a cair de sua boca, impossibilitando a articulação correta das palavras. A mão que segurava a calça se levantou para fechar o ferimento. A cena não era muito bonita. Um homem velho sem calça no corredor, exibindo uma cueca vermelha. Uma imagem grotesca. Algumas mulheres do primeiro piso abriram suas portas lentamente para ver o que se passava. Espionavam pelas frestas. Algumas exibiam um sorriso de redenção. Outras pareciam não acreditar no que viam. Por final ele mirou entre as pernas do senhorio e arrancou dele seu último instrumento de tortura de meninas inocentes. Deu a volta e fechou atrás de si mais um capítulo de sua história. Caminhou até o seu último local trabalho forma. Bateria o ponto uma última vez. Conversou com o vigia, amigo de longa data, que o deixou entrar no prédio no final de um domingo sangrento. Ele costumava dormir no trabalho algumas vezes. Por isso o vigia não estranhou nada. Na segunda-feira, pela manhã, acordou mais cedo que o costume. Lavou o rosto na pia do banheiro, passou a mão sobre os cabelos e ajeitou-os para trás. Arrumou a camisa, colocando-a para dentro da calça. Bochechou um pouco de água e cuspiu pela última vez naquela pia. Entrou na sala do chefe e o esperou sentado na cadeira confortável da qual o maldito costumava dar ordens e gritar metas metas absurdas. Às oito horas da manhã, a porta do escritório se abriu e um sujeito que costumava ser intolerante, ao ver uma arma apontada em sua direção, se mijou todo. Antes que pronunciasse qualquer choro ou fizesse qualquer promessa, fechou os olhos para sempre.

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