segunda-feira, 11 de maio de 2009

Foram tarde

Eles o acompanharam durante meses. Acobertando tudo. Um dia resolveu. Cortou todos. Os cabelos se foram tarde.

domingo, 10 de maio de 2009

Hambre de Vivir

Deitado. Olhar-janela vidrado nas coisas de fora. Movimento ausente. Vontade de viver. Imóvel, no entanto, parece o contrário. Ele pode se mover. Apenas não quer. O cerébro maquina valores e viagens. Não move um fio de cabelo. Nem para as necessidades fisiológicas. O lençol está limpo. Até quando?

sábado, 9 de maio de 2009

Pedras na Calçada

O caminho é longo. Viro à direita, depois à esquerda. Acho que a Esperança está longe. Não tenho grana para o taxi, para o metrô ou para o ônibus. Só a pé. Um dia eu chego lá. Enquanto isso vou contando as pedras da calçada. Estreita calçada com guia de cego e muitos entulhos, humanos e não-humanos. Queria não ter de desviar de outro corpo, apenas trespassá-lo. O esbarrão, às vezes, é bom, mostra que a gente tá vivo, mas tem horas que um esbarrão dói, machuca, e a gente tem que pedir desculpa. Eu não gosto de pedir desculpa. Eu não tenho culpa. Eu caminho num caminho que é meu, que não é de mais ninguém. Se eu for pedir desculpas sempre que esbarrar em outro corpo, não chegarei nunca no meu objetivo. Eu comecei a divagar sobre o que não queria. Tenho apenas que caminhar um pouco mais para chegar lá, onde o mundo não é torto, onde as calçadas são largas, onde os carros param quando damos sinal de vida. Alguns dizem que esse lugar é Brasília, eu chamo de Utopia.

terça-feira, 5 de maio de 2009

O mistério do teclado

A não era bem um A. Tava mais para B, um nível mais baixo que as outras letras. E tava agarrada, bem fundo no teclado encardido de 2005. Eu não quero comprar outro teclado feito na Ásia por menores de idade que recebem menos centavos do que o total de letras do meu teclado. 111 centavos. 1,11 reais, dólares, euros... ienes, não. Eu tinha uma Olivetti, máquina de escrever, que eu limpava os tipos de tanto batucá-la. Era pesado escrever em máquina. Você não podia errar. Fazia matemática para formatar uma página, as margens. Contava o número de caracteres. Eu fiz curso de datilografia no Senac. Nem sou tão velho assim. Fiz na década de 1990. Não lembro exatamente que ano, mas se procurar na papelada acho o diploma. No fundo da sala haviam computadores. Como eu não tinha computador naquela época, apenas máquina de escrever, uma Remington do meu pai, mais pesada que a Olivetti, eu optei pelo curso de datilografia. Foi legal. Depois, descobri que seria útil. Fui bolsista e monitor na Rádio Universitária de Goiânia e, no começo da minha temporada lá, era máquina de escrever e muito papel carbono para preencher em caixa alta as laudas dos programas. Vou pesquisar onde reciclam teclados. Esse negócio de descartar as coisas no lixo comum é perigoso.

sábado, 2 de maio de 2009

Dormência / O Morto

Sobre o braço dormi à noite
Não tinha espaço
O cadáver ao lado não se mexia
Olhos noturnos olhei
Não era ele
Ou ele era
Ele era eu
O cadáver era eu
Morto incubado no colchão
O dia não amanheceu
Pois a persianas estavam fechadas
Se não vejo luz, não acordo
Se não acordo, não vivo
Era mesmo um cadáver
Dormentes
O braço e o cabelo
Quando morto, o cabelo cresce
O meu já estava grande
Dormindo de mal jeito
Ele torceu
E o couro cabeludo doeu
Apenas à tarde
Quando o morto já estava bem vivo
Na frente do computador declarando:
"Eu não morri".

sexta-feira, 1 de maio de 2009

Grisalhos Tarados

Coloquei um detector de movimento neste blog há algum tempo. Hoje entrei na sala de segurança para ver o que achava. Um paulista procurava grisalhos tarados pelo Google. Eu não sei se encontrou, mas aqui ele passou. Tentei mudar os meus Grisalhos, porém não custa nada aguardar. A tara de um e outro um dia há de passar.

Cubo de gelo gelando na janela

Persiana fechadas. Gruta escura. Um urso hiberna. A geladeira congela. O frio amansa o sentimento. O cobertor aquece o corpo-pedra que dorme sem hora para acordar. A escova está na pia. Nenhum dente para escovar. O lixeiro não passou. As sacolas na área de serviço exalam o cheiro do estragado, dos restos de ontem. A comida sobre o fogão não foi posta na geladeira. Conserva-se assim no frio ambiente. Os olhos do urso abriram de manhã, no escuro é como se não tivesse aberto. O ouvido contava os tremores dos ônibus lá fora. Estavam no horário? Quem se importa? É feriado.